A TEORIA DA CODIFICAÇÃO E DECODIFICAÇÃO DE STUART HALL

Você não entendeu errado - só viu de outro jeito! A Teoria da Codificação e Decodificação de Stuart Hall

Olá, caros leitores!

    Nesta sétima postagem, vamos conversar sobre um tema fundamental para quem se interessa por comunicação, cultura e mídia: a Teoria da Recepção, desenvolvida pelo pensador cultural Stuart Hall.

Por que a gente entende as coisas de jeitos tão diferentes?

    Já reparou que duas pessoas podem assistir ao mesmo filme ou ver a mesma notícia e sair com conclusões completamente diferentes? Isso acontece porque, na comunicação, o que importa não é só o que é dito, mas também quem está ouvindo e como interpretaVocê já parou pra pensar que uma propaganda, uma notícia ou até uma postagem nas redes sociais pode ser interpretada de formas totalmente diferentes por pessoas diferentes? Pois é! Isso não acontece por acaso, e um dos pensadores que mais ajudou a explicar isso foi Stuart Hall, com sua teoria da codificação e decodificação. Hall dizia que a comunicação não é um processo tão simples quanto parece. Nem sempre a mensagem que uma pessoa envia é recebida exatamente do mesmo jeito por quem a lê ou assiste. Isso me fez refletir bastante sobre como nós interpretamos o que consumimos diariamente.

Quem foi Stuart Hall e o que ele pensava sobre a mídia


    Stuart Hall nasceu na Jamaica, mas viveu boa parte da sua vida na Inglaterra. Ao mudar-se para o Reino Unido, passou a conviver diretamente com tensões sociais, raciais e culturais marcantes, o que influenciou profundamente seu pensamento. Ele se tornou um dos principais teóricos da comunicação e da cultura, sendo também um dos fundadores dos Estudos Culturais. Para Hall, a mídia não era apenas um reflexo neutro da realidade, mas sim um espaço de disputa de significados — um campo onde ideias, valores e ideologias são constantemente construídos, reforçados ou contestados. Ele argumentava que, muitas vezes, a mídia serve aos interesses de grupos dominantes, moldando o modo como as pessoas enxergam o mundo sem que percebam isso claramente. Até uma simples notícia ou um comercial de TV carrega escolhas ideológicas: o que é mostrado, o que é omitido, como é narrado e de que ponto de vista. Hall nos convida a enxergar que toda comunicação está carregada de intenção, e que compreender isso é essencial para desenvolver um olhar mais crítico e consciente diante da mídia que consumimos todos os dias.

O que é codificar uma mensagem?

    Codificar é o momento em que alguém cria e envia uma mensagem — pode ser uma propaganda, um post no Instagram, uma fala num debate, uma reportagem no jornal. A pessoa escolhe palavras, imagens, sons, tudo de forma pensada pra passar uma ideia.

Exemplo 1:

    Pense num professor que diz: “Vocês têm que estudar muito pra passar de ano!”. Ele acha que está incentivando. Mas pra alguns alunos, essa fala pode parecer uma bronca, uma pressão. A mensagem foi codificada de um jeito, mas pode ser decodificada de outro.

    Para alguns, essa fala pode soar como uma bronca, uma cobrança pesada que gera ansiedade e medo. Em vez de sentir estímulo, eles podem se sentir pressionados, inseguros, como se o professor estivesse impondo uma ameaça velada: “Se você não se esforçar, vai fracassar.” Para esses alunos, a mensagem acaba carregada de tensão e pode até desmotivá-los, pois se sentem pressionados a um ponto em que o estudo deixa de ser uma escolha e vira uma obrigação angustiante.

    Esse exemplo ilustra algo muito importante na comunicação: o processo de codificação e decodificação da mensagem. O professor codifica, ou seja, emite a mensagem com uma intenção positiva — incentivar o estudo para que o aluno tenha sucesso. Mas a decodificação, que é a forma como o receptor interpreta essa mensagem, pode variar muito. Ela depende do repertório do aluno, de suas vivências anteriores, de suas emoções no momento e do contexto em que a fala é dita.


E decodificar? É o jeito que cada um entende a mensagem

    A decodificação é o momento em que a mensagem chega ao público — e aí entra a bagagem de cada um: vivências, cultura, valores, crenças, idade, até o humor no dia. Tudo isso influencia a forma como a gente interpreta aquilo que está ouvindo ou vendo.

Exemplo 2:

   Vi uma campanha sobre economia de água que passou na televisão outro dia. A propaganda era toda bonitinha, cheia de animações coloridas, com crianças sorrindo e frases de efeito como “cada gota conta!”. Confesso que, de início, achei fofa e bem-intencionada. A ideia era passar uma mensagem educativa de forma leve e acessível. Mas, quando comentei com meu avô — que nasceu e foi criado no interior, onde passou boa parte da vida enfrentando períodos de seca severa e tendo que buscar água em baldes, caminhando quilômetros —, ele reagiu de um jeito totalmente diferente. Ele olhou pra tela com certo desdém e disse: “Esses aí não têm noção do que é falta de água de verdade...”. Aquilo me fez pensar. Enquanto eu estava focado na estética da campanha, ele imediatamente relacionou a mensagem com a própria vivência, sentindo que aquilo minimizava uma realidade muito mais dura. Foi uma lição prática da teoria de Stuart Hall: a mesma mensagem, ao passar por diferentes trajetórias de vida, adquire significados completamente distintos.


Três formas de decodificar uma mensagem

    Hall identificou três posições que as pessoas podem adotar ao interpretar uma mensagem:

Leitura dominante (ou preferencial)

    É quando você entende e concorda com a mensagem como ela foi pensada. Tipo quando um comercial emociona e você chora exatamente como o anunciante queria.

Leitura negociada

    Aqui você entende a mensagem, mas adapta ao seu contexto. Você aceita uma parte, mas questiona outra. Como quando você assiste um filme de herói, curte a ação, mas acha meio forçado o patriotismo exagerado.

Leitura oposicional

    É quando você entende a mensagem, mas rejeita totalmente o que ela tenta passar. Um exemplo meu: vi uma campanha de carro que associava sucesso profissional a ter um modelo de luxo. Pra mim, isso não faz sentido. Acho que sucesso é outra coisa. Essa seria minha leitura oposicional.

A comunicação é um processo em quatro etapas

Segundo Hall, o processo comunicativo tem quatro momentos principais:

Produção – A criação da mensagem. Aqui entra quem planeja, grava, escreve, edita.

Circulação – É como essa mensagem chega até você: TV, rede social, jornal...

Uso ou consumo – O momento em que o público consome e interage com a mensagem.

Reprodução – A resposta do público: compartilhar, comentar, comprar, reagir.

No fim das contas, todo mundo tem voz

      A parte mais bacana da teoria de Stuart Hall é justamente essa valorização da autonomia do público. Diferente de modelos anteriores que tratavam as pessoas como receptores passivos das mensagens veiculadas pela mídia, Hall mostra que a comunicação é um processo muito mais dinâmico e complexo. Não somos apenas consumidores passivos que recebem tudo o que a mídia entrega sem questionar — ao contrário, somos ativos na construção do sentido das mensagens.

  Quando assistimos a um comercial, lemos uma notícia, navegamos nas redes sociais ou acompanhamos um vídeo, não absorvemos aquilo de forma automática. Nós interpretamos, adaptamos, criticamos e até contestamos o conteúdo. Essa capacidade de dar novos significados às mensagens, de negociar e, por vezes, rejeitar o que é transmitido, transforma completamente a forma como entendemos a comunicação. O público, então, não é apenas alvo da mensagem, mas parte integrante do processo, participando ativamente da construção de sentido.

    Isso é especialmente relevante na era em que vivemos, marcada por um excesso gigantesco de informação. Somos bombardeados o tempo inteiro — por propagandas que querem nos vender um estilo de vida, por notícias que podem ser verdadeiras ou manipuladas, por vídeos virais, por milhares de tweets e posts nas redes sociais. Toda essa avalanche de conteúdos cria um cenário complexo, em que não basta receber a informação; é preciso saber como filtrar, interpretar e refletir sobre o que estamos consumindo.

    Entender que a forma como lemos o mundo é influenciada pela mídia, pela cultura e por contextos sociais, mas que essa leitura não é determinada de forma rígida, é fundamental para desenvolver nosso senso crítico. Não somos marionetes controladas pela mídia, mas sujeitos que podem escolher o que aceitar, rejeitar ou transformar. Essa autonomia do público é um passo decisivo para que possamos atuar de maneira consciente na sociedade, questionando narrativas, reconhecendo manipulações e participando ativamente da construção do conhecimento.

    Portanto, a teoria de Stuart Hall nos convida a repensar o papel da comunicação e a valorizar o protagonismo de cada um na interpretação das mensagens. É um convite a sermos mais críticos, atentos e conscientes, exercendo nossa capacidade de leitura e reflexão sobre tudo o que chega até nós.


REFERÊNCIAS

HALL, Stuart. Encoding and decoding in the television discourse. Discussion Paper. University of Birmingham, Birmingham. p. 1-19, 1973. Disponível em: http://epapers.bham.ac.uk/2962/. Acesso em: 18 maio 2025.

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